O Ministério da Saúde só recebeu uma de cada cinco doses de vacinasencomendadas contra a varíola dos macacos, renomeada para Mpox pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Para especialistas ouvidos pelo JOTA, a lentidão na entrega — apenas 9,8 mil das 50 mil previstas chegaram — dificulta frear o aumento de casos.
O Ministério da Saúde da gestão Jair Bolsonaro evitou indicar uma data para receber as remessas restantes. Até meados de dezembro, a informação era a de que se mantinha a previsão de chegada para até o fim deste mês — a primeira projeção indicava novembro.
O prazo exíguo e a escassez dessas vacinas em cenário mundial reforçam as chances de que ao menos uma parcela das outras 40,2 mil doses atrase, chegando ao país só em 2023. Na última semana de dezembro, o JOTA insistiu nos questionamentos sobre as entregas de vacinas contra Mpox à pasta, mas não houve resposta.
Com a recomendação padrão para administrar duas doses de vacina por pessoa, a aplicação acaba restrita. Além disso, há uma reserva de perda técnica em torno de 10% das doses. O Brasil poderia vacinar, portanto, até cerca de 22,5 mil pessoas se receber o total de imunizantes comprados.
“A quantidade de vacinas adquiridas é insuficiente, porque o ideal seria que toda a população que tem maior risco de exposição à Mpox fosse vacinada. Com a falta de informação, é possível que um número maior ainda de pessoas se exponha à doença, que pode ser grave e fatal, sobretudo em imunossuprimidos”, explicou a infectologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Raquel Stucchi.
Dados da pasta registram que pelo menos 10.544 pessoas foram diagnosticadas com a doença até 3/1, das quais 15 morreram. Nesse cenário, o Brasil figura em 2º lugar nos rankings de casos e de óbitos por varíola dos macacos, atrás dosEstados Unidos, aponta monitoramento do Our World In Data.
O fim do estoque do tecovirimat, único antiviral liberado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) contra a varíola dos macacos, aprofunda os riscos em relação à doença no Brasil. Pacientes, sobretudo em quadros graves, podem ficar desassistidos em caso de progressão das lesões provocadas pela infecção.
“Já acabou (o tecovirimat), não tem mais. O ministério comprou um quantitativo muito baixo e falou que não tem previsão de compra. O medicamento poderia ser usado nos pacientes hospitalizados, com formas mais graves e múltiplas lesões. Há casos de cegueira Mpox. A medicação antiviral específica pode reduzir a progressão da doença”, disse o presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT), Julio Croda.
Ainda não há previsão para estender a vacinação à população geral. O ministério definiu o público-alvo como pessoas que tiveram contato com infectados, pessoas que usam profilaxia pré-exposição (PrEP) para prevenir a infecção por HIV ou em tratamento contra esse vírus, causador da Aids. Procurada sobre a distribuição do fármaco, a pasta também não respondeu.
“Há países que estão fazendo a dose subcutânea e a dose fracionada, o que aumenta a capacidade. Tem países que usam só uma dose para ofertar a um maior número de pessoas”, sugeriu Croda, infectologista e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
O primeiro lote de vacinas, anunciado com 20 mil doses, deveria ter sido entregue em setembro. Pouco menos da metade, no entanto, desembarcou no país — e sóem outubro. A pasta contratou 50 mil doses da fabricante Bavarian Nordic por intermédio da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), escritório da OMS nas Américas.
Questionada pelo JOTA sobre a possibilidade de atraso, a Opas não respondeu até o fechamento do texto.
Fonte: JOTA