{"id":208,"date":"2022-12-15T15:47:34","date_gmt":"2022-12-15T18:47:34","guid":{"rendered":"https:\/\/fundopositivo.org.br\/portalmpox\/?p=208"},"modified":"2022-12-22T07:47:05","modified_gmt":"2022-12-22T10:47:05","slug":"monkeypox-doenca-de-brancos-vivendo-em-regioes-ricas-o-que-isso-ensina","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/fundopositivo.org.br\/portalmpox\/monkeypox-doenca-de-brancos-vivendo-em-regioes-ricas-o-que-isso-ensina\/","title":{"rendered":"Monkeypox: doen\u00e7a de brancos vivendo em regi\u00f5es ricas; o que isso ensina?"},"content":{"rendered":"\n
Na longa lista de promessas de Ano Novo que o governo Lula ter\u00e1 de fazer na \u00e1rea da sa\u00fade deveriam estar pol\u00edticas p\u00fablicas para conter e tratar todos os casos de var\u00edola dos macacos, ou monkeypox, se preferir. Eu sei, est\u00e1 todo mundo caladinho a seu respeito, como tivesse sido apenas mais um v\u00edrus que passou em nossas vidas. Mas ele continua por aqui. E, talvez, com uma tend\u00eancia a mudar um pouco o perfil de suas v\u00edtimas.<\/p>\n\n\n\n
“O registro de novos casos vem diminuindo no mundo todo, mas a doen\u00e7a continua sendo transmitida, inclusive entre mulheres e crian\u00e7as”, avisa o patologista Paulo Ricardo Martins-Filho, professor da UFS (Universidade Federal de Sergipe), apontado como um dos cientistas mais influentes do mundo na \u00e1rea de cl\u00ednica m\u00e9dica e odontologia. Quem diz isso n\u00e3o sou eu, mas a mais recente edi\u00e7\u00e3o do ranking da Universidade Stanford, nos Estados Unidos. A lista \u00e9 criada com base em an\u00e1lise de dados, chegando aos 2% de cientistas mais relevantes em suas respectivas \u00e1reas. Entre outras linhas de pesquisa na qual mergulha, nos \u00faltimos tempos ele e seu grupo na UFS se dedicaram ao estudo da monkey<\/p>\n\n\n\n
H\u00e1 menos de dez dias, no \u00faltimo 6 de dezembro, o professor baiano, mas sergipano de cora\u00e7\u00e3o, assinou um artigo que saiu na Travel Medicine and Infectious Disease, no qual pinta o retrato n\u00edtido da doen\u00e7a no Brasil, pa\u00eds que tem \u2014sabia?\u2014 12% de todos os casos desde maio deste ano, quando o mundo come\u00e7ou a registrar surtos da infec\u00e7\u00e3o, que \u00e9 end\u00eamica em pa\u00edses da \u00c1frica, como Congo e Nig\u00e9ria. De l\u00e1 para c\u00e1, foram mais de 80 mil pessoas com var\u00edola dos macacos em diversos cantos do planeta, sendo perto de 10 mil brasileiros. Aqui, s\u00e3o 4,6 casos para cada 100 mil habitantes, uma propor\u00e7\u00e3o muito pr\u00f3xima da do Reino Unido e da Alemanha \u2014lembrando, por\u00e9m, que somos maiores do que esses dois pa\u00edses, com a popula\u00e7\u00e3o de 213 milh\u00f5es de brasileiros, o que faz o nosso n\u00famero absoluto pesar.<\/p>\n\n\n\n
Perdemos para quem? Para os Estados Unidos, com quase 9 casos por 100 mil habitantes, e para a Espanha, com 15,6 para cada 100 mil. “Apesar de termos uma das maiores incid\u00eancias do mundo, faltava investigar o comportamento da monkeypox entre n\u00f3s”, observa o professor. Seu trabalho avaliou cuidadosamente todos os 9.729 casos que tivemos entre 9 de junho e 23 de novembro deste ano, entre os quais foram registradas 12 mortes provocadas pela doen\u00e7a.<\/p>\n\n\n\n
As li\u00e7\u00f5es dos n\u00fameros<\/strong><\/p>\n\n\n\n Em geral, quando algu\u00e9m nos apresenta n\u00fameros relacionados \u00e0 sa\u00fade, como estou fazendo agora, eles sempre parecem frios, distantes de n\u00f3s, do nosso dia a dia. Mas o professor Martins-Filho garante que n\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n Estudos assim, que ele chama de ecol\u00f3gicos, mostram n\u00e3o apenas a distribui\u00e7\u00e3o e a frequ\u00eancia da infec\u00e7\u00e3o, mas como um v\u00edrus se comporta, o tipo de manifesta\u00e7\u00e3o e at\u00e9 determinantes socioecon\u00f4micos por tr\u00e1s do problema \u2014o que permite, a quem ligar os seus pontos, algumas boas reflex\u00f5es. Vamos l\u00e1.<\/p>\n\n\n\n \u00c0 primeira vista, a monkeypox \u00e9 uma doen\u00e7a de homens \u2014 por enquanto, eles s\u00e3o 92,2% dos infectados. Mais: de homens jovens, j\u00e1 que a maioria, ou 73,6%, tem entre 20 e 39 anos de idade. Mais ainda: de homens jovens e brancos, porque apenas 26,9% dos doentes se autodeclararam pardos e 10,9%, pretos para o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estat\u00edstica). Indo al\u00e9m: a maior parte \u00e9 formada por homens brancos e jovens que fazem sexo com outros homens, j\u00e1 que, entre eles, 57,7% dizem ser homossexuais e 9,8% s\u00e3o bissexuais, sem contar os quase 13% que preferem n\u00e3o se definir em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 sexualidade. Para fechar, a maior parcela vive em regi\u00f5es ricas, principalmente no Sudeste e no Centro-Oeste. Ali\u00e1s, nos estados mais ricos dessas regi\u00f5es e, digo mais, nos munic\u00edpios com maior IDH (\u00cdndice de Desenvolvimento Humano) desses estados ricos.<\/p>\n\n\n\n ogo, voc\u00ea e eu corremos o risco de sair por a\u00ed dizendo que a monkeypox \u00e9 uma doen\u00e7a de homens brancos, jovens, homossexuais ou bissexuais, e ricos. Mas tenhamos cuidado. Estudos como o do professor Martins-Filho servem justamente para a gente tentar entender o que est\u00e1 por tr\u00e1s dos n\u00fameros. Sem preconceito, nem racioc\u00ednio apressado.<\/p>\n\n\n\n S\u00f3 em brancos e ricos, ser\u00e1 mesmo?<\/strong><\/p>\n\n\n\n Dif\u00edcil imaginar que n\u00e3o existam indiv\u00edduos pardos e pretos expostos a esse v\u00edrus. “Vimos a mesma coisa no in\u00edcio da pandemia de covid-19”, lembra Martins-Filho. Sim, os primeir\u00edssimos registros da infec\u00e7\u00e3o pelo Sars-CoV-2 se concentravam nas regi\u00f5es mais ricas e entre pessoas mais favorecidas do ponto de vista econ\u00f4mico. E precisamos enxergar as cores da desigualdade: essas regi\u00f5es, no Brasil, s\u00e3o dominadas por moradores brancos. “Isso indica muito mais um problema de acesso aos servi\u00e7os de sa\u00fade”, pensa o professor. “Infelizmente, existem pessoas em situa\u00e7\u00f5es de maior vulnerabilidade socioecon\u00f4mica que tiveram a doen\u00e7a e n\u00e3o receberam o diagn\u00f3stico. Isso acabou contribuindo para a manuten\u00e7\u00e3o de uma alta taxa de transmiss\u00e3o do v\u00edrus da monkeypox pelo pa\u00eds”, acredita o patologista. Temos 12% de todos os casos do mundo, vale repetir.<\/p>\n\n\n\n Se uma pandemia como a de covid-19 n\u00e3o ensinou a todos que, diante de uma infec\u00e7\u00e3o viral se espalhando, n\u00e3o tem conta banc\u00e1ria, nem cor de pele que nos proteja quando n\u00e3o existem medidas de preven\u00e7\u00e3o iguais para todos, n\u00e3o sei como desenhar a situa\u00e7\u00e3o da monkeypox \u2014bem menos assustadora do que a da covid-19, fato ineg\u00e1vel. <\/p>\n\n\n\n N\u00e3o \u00e9 uma infec\u00e7\u00e3o sexualmente transmiss\u00edvel <\/strong><\/p>\n\n\n\n N\u00e3o, n\u00e3o \u00e9. Logo, bom sublinhar, n\u00e3o \u00e9 uma infec\u00e7\u00e3o que possa ser associada a um g\u00eanero ou a uma orienta\u00e7\u00e3o sexual por si s\u00f3. Qualquer coisa que se falar diferente disso \u00e9 preconceito e miopia em rela\u00e7\u00e3o ao que pode ser feito para evitar a transmiss\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n Na investiga\u00e7\u00e3o, o professor e seus colegas viram que mais de 60% dos pacientes tinham les\u00f5es na regi\u00e3o anal, perianal e genital, com hist\u00f3rico de exposi\u00e7\u00e3o a m\u00faltiplos parceiros sexuais de duas a tr\u00eas semanas antes de elas surgirem. Ali\u00e1s, para n\u00e3o sair repetindo que essa \u00e9 uma doen\u00e7a de homens que transam com homens, nas mulheres contaminadas, 75% das les\u00f5es eram nessa \u00e1rea do corpo tamb\u00e9m e outras, 25% na regi\u00e3o oral.<\/p>\n\n\n\n Mas \u2014 veja que interessante \u2014 em outro estudo do professor Martins-Filho e seus colegas, confirmou-se que os fluidos do corpo, como s\u00eamen, urina, fezes e plasma, n\u00e3o s\u00e3o um material muito bom para flagrar o v\u00edrus. No entanto, ele estava muito presente em 99% das amostras de les\u00f5es de pele e em mais de 85% das amostras com c\u00e9lulas da regi\u00e3o da garganta, colhidas por meio do swab, aquela esp\u00e9cie de cotonete comprido que a gente passou a conhecer bem nos \u00faltimos anos.<\/p>\n\n\n\n “Isso confirma que \u00e9 muito pouco prov\u00e1vel algu\u00e9m se infectar por meio de trocas de fluidos corporais durante o sexo”, explica o patologista. “Em compensa\u00e7\u00e3o, as les\u00f5es de pele t\u00eam uma alta infectividade, como costumamos dizer. \u00c9, mesmo, no contato direto e prolongado com a ferida que a doen\u00e7a pode passar de uma pessoa para outra e isso tem maior probabilidade de acontecer em uma rela\u00e7\u00e3o sexual.”<\/p>\n\n\n\n Em rela\u00e7\u00f5es sexuais sexual entre quaisquer pessoas, diga-se. Mais uma vez citando o trabalho rec\u00e9m-publicado, at\u00e9 o momento 8% dos casos s\u00e3o em mulheres. Qualquer forma de discrimina\u00e7\u00e3o por g\u00eanero, orienta\u00e7\u00e3o sexual ou comportamento, al\u00e9m de ser feia por natureza, agrava o problema. “Isso porque leva a um aumento de disparidade na sa\u00fade”, observa Martins-Filho. Ou seja, com medo do dedo em riste, muita gente se encolhe com os sintomas e deixa de procurar ajuda.<\/p>\n\n\n\n E, claro, a monkeypox n\u00e3o \u00e9 transmitida s\u00f3 nesse momento de maior intimidade, se \u00e9 que me entende. Atualmente, 5% dos registros brasileiros s\u00e3o em crian\u00e7as e adolescentes. E n\u00e3o deduza que um menino ou uma menina com monkeypox foi v\u00edtima de abuso sexual \u2014 a transmiss\u00e3o da doen\u00e7a depende de contato de pele apenas.<\/p>\n\n\n\n Pensando em 2023.<\/strong><\/p>\n\n\n\n Cerca de quatro em cada dez pessoas infectadas pelo v\u00edrus da monkeypox tinham, ainda, o HIV. Ent\u00e3o, para come\u00e7o de conversa, quem aparece com as les\u00f5es t\u00edpicas da var\u00edola dos macacos deveria fazer o teste para saber se n\u00e3o tem o v\u00edrus da imunodefici\u00eancia humana, pelo sim, pelo n\u00e3o. “Assim como, para conter a transmiss\u00e3o, o certo seria rastrear os parceiros sexuais nas semanas anteriores para descobrir se eles n\u00e3o est\u00e3o com monkeypox tamb\u00e9m”, informa o professor. E, de novo, por causa do esfrega-esfrega da pele.<\/p>\n\n\n\n “Por sua vez, em aproximadamente 20% dos portadores do HIV diagnosticados com monkeypox, encontramos outras infec\u00e7\u00f5es, como s\u00edfilis e gonorreia”, conta o patologista. Isso aponta para mais um desafio desta nova era de governo: retomar as t\u00e3o necess\u00e1rias pol\u00edticas p\u00fablicas de educa\u00e7\u00e3o e preven\u00e7\u00e3o das infec\u00e7\u00f5es sexualmente transmiss\u00edveis. A monkeypox n\u00e3o faz parte dessa turma, mas costuma andar por perto.<\/p>\n\n\n\n Publicado em 15\/12\/2022<\/p>\n\n\n\n Fonte: https:\/\/www.uol.com.br\/<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Na longa lista de promessas de Ano Novo que o governo Lula ter\u00e1 de fazer na \u00e1rea da sa\u00fade deveriam estar pol\u00edticas p\u00fablicas para conter e tratar todos os casos de var\u00edola dos macacos, ou monkeypox, se preferir. Eu sei, est\u00e1 todo mundo caladinho a seu respeito, como tivesse sido apenas mais um v\u00edrus que […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":209,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[1],"tags":[],"class_list":["post-208","post","type-post","status-publish","format-standard","has-post-thumbnail","hentry","category-noticias"],"yoast_head":"\n